sábado, 16 de junho de 2012

Da Fé à Possessão

Há algum tempo atrás - mas nem tanto assim- era bem comum quando o leite azedava rapidamente numa casa, o dono do sítio ía aos vizinhos para ver se o mesmo fato havia ocorrido em seus lares.  Se positivo era certo que o local estava com uma possessão. Na humanidade este fato é observado desde que se tornaram conhecidas as culturas egípcia, babilônica, assíria e judaica, onde atribuíam-se certas doenças e calamidades naturais à ação dos demônios. E para isto sempre existiram vários rituais de exorcismo - palavra do grego exorkismós, "ato de fazer jurar", pelo latim exorcismu.
Na Umbanda não existem demônios e não se crê no inferno. Ainda não cheguei a uma conclusão se isto é bom ou mal, então gostaria de refletir com você que lê agora alguns pontos importantes. A princípio a Umbanda é a celebração da vida, pois observa e interage com as forças naturais que regem nosso planeta. Todas as entidades representadas na religião tiveram uma relação grande com a Natureza: os índios em seu respeito à mata, os pretos velhos no conhecimento das ervas e manipulação de energias, os boiadeiros e marinheiros na observação e uso dos elementos naturais na própria sobrevivência, os ciganos na adequação da energia e transmutação da mesma devido ao fato de serem andarilhos, das crianças que conseguem enxergar e passar mais claramente a magia em cada elemento novo e por fim os exus/pombogiras guardiões das energias mais sutis por justamente terem adquirido o poder de manipulá-las. 
O médium é a porta , ou melhor, a ponte que possibilita a travessia deste conhecimento até a pessoa que o necessita. Só.  Em um atendimento de caridade ,feito com responsabilidade por um médium ciente, seguem-se alguns princípios básicos: o primeiro é o respeito ao livre arbítrio -nada de amarrações ou induções- ,o segundo é a primazia pelo equilíbrio, nunca fomentando situações que venham a fomentar mais desajustes. Numa brilhante frase de Carl Young que li estes dias visualizei todo um processo em nossa religião: "O encontro de duas personalidades assemelha-se ao contato de duas substâncias químicas: se alguma reação ocorre, ambos sofrem uma transformação." No caso específico da Umbanda três personalidades se transformam em um atendimento: a entidade, o médium e o consulente. Cada vez que se consegue equilibrar e elevar energias, há sem sombra de dúvida um crescimento e uma evolução conjunta, que beneficia não só o consulente ou ao médium, mas um pequeno microcosmo, como, por exemplo, a família dos dois.
O problema surge quando o médium desavisado, sem conhecimento das leis universais que regem toda e qualquer ação nesta terra, resolve que tem poderes ilimitados e que seu cérebro não tem qualquer outra função que não seja a de manipular em seu próprio proveito qualquer tipo de energia. Alguns umbandistas sofrem de um mal do qual as vezes não se dão conta: o ego super inflado. Então através desta doença, se acham vítimas de todos os outros umbandistas que têm 'inveja" de seus super poderes e vivem "desmanchando" o que fizeram de mal contra a santidade de sua mediunidade. Ou pior, induzem os seus próximos a erro, fazendo amarrações e trazendo o "amor" de volta em três dias. Estes são vítimas inexoráveis de sua própria ignorância, fato que os deixa disponíveis para possessões- pela lei que diz que os iguais se atraem. Neste ponto é que vem minha dúvida- se estas pessoas acreditassem no mal, será que não mudariam suas posturas? De fato , cada um é o que come e com o que alimenta os outros.
A Umbanda, creiam, está passando por um momento de crescimento e muitos estão reavaliando as suas próprias posturas. Todo crescimento envolve o caos, o que precede sempre o nascimento de uma estrela. São muitas as vertentes que nos orientam dentro da própria Umbanda para o caminho da real caridade e equilíbrio. Que Ogum sempre nos permita caminhar pelas estradas retas da verdadeira Umbanda e que Yansã transmute qualquer energia contrária. Axé a todos.


Indico o texto do meu irmão de coração Babalorisá Samir Castro ,que demonstra extrema coerência em seus dizeres sobre o Candomblé:

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Lucidez não tem Preço!

Só quem tem porteira em casa sabe da tristeza que é. Ter que sair do carro abrir a dita cuja e esperar pra fechar. Tem um amigo taxista que é a favor de colocarmos um portão eletrônico. Besteira. O tempo que a máquina leva pra fechar o dito portão faria com que nosso cavalo já estivesse a uns 300 metros de distância no galope. Fora que ter a área cercada de arame farpado e um portão eletrônico não combinaria.
De fato, seria, com todo respeito, usar um belo sapato de grife e andar com a bunda de fora. É engraçado ,mas as pessoas fazem isto o tempo inteiro. Hoje a profusão de textos para lermos é enorme, embora conhecer não seja o mesmo que saber. 
Saber se adquire pela prática, conhecer pela leitura. Práticas feitas só com leitura levam a erro, pelo menos na Umbanda. De fato, trabalhamos com energia e nós próprios somos energia, então temos que necessariamente experimentar o que nos propomos a fazer. A Umbanda é vida e ,assim sendo, tem que ser vivenciada, tem que ser aberta a experiências, necessita do exercício da mente não em decorar, mas falo de novo , experimentar.
As pessoas de uma forma geral se perdem na simplicidade. Simplesmente porque não conseguem processar, a mente humana busca por desafios, por coisas complexas, como se fosse uma musculação intelectual, o que permite uma injeção de dopamina e felicidade, coisa que a simplicidade não provoca. Ser simples não faz com que nenhum hormônio seja despejado em nossas correntes sanguíneas.
O saber na Umbanda está diretamente relacionado à caridade. É na prática da caridade que aprendemos, não há como ser diferente. Como já falei outras vezes, a caridade é complexa. Incorporar uma entidade e deixar que ela atue através de nós, sem que a influenciemos com nossos conceitos, é um ato de caridade. Tem muito médium que "usa" a incorporação para colocar suas próprias idéias - e isso- é o contrário de caridade. Entidade nenhuma - seja de esquerda ou de direita- jamais atribui nenhuma ação a si própria - eu fiz, eu faço, eu aconteço-porque ela trabalha em conjunto com o Divino. Pode até falar que ela se encarrega de uma proteção específica, mas jamais em tempo algum provocará situações de conflito ou mal estar. Observar, pensar e concluir também é caridade, mesmo que sirva só para nós.
Ogum não faz "limpeza" de gente em terreiros - ou seja, não manda ninguém embora porque é melhor ou pior-, preto velho não causa discussões para acertar arestas, Pomba Gira não é vaidosa - tenha sempre a certeza que eles estão acima de nossos sentimentos terráqueos e mundanos. 
Tenho uma amiga chamada Renata Coutinho, um ser que anda irradiando luz, simplesmente porque se permitiu entrar em reflexão diante de suas observações da vida. E dela me veio o cristal bruto: lucidez não tem preço. E assim , vi nesta menina o reflexo Divino. Porque quando a pessoa se presta a refletir a Luz que vem do Alto e não de sua própria mente, tem reais condições de ajudar e prestar a real caridade.  Não pode nunca ser diferente.
A Umbanda não foi criada para adorarmos um ser humano, mas para nos reintegrarmos às energias Divinas da natureza, para elevarmos e reequilibrarmos nossas energias à energia geradora- à caridade. Fora da caridade não há salvação.É colocar portão eletrônico em cerca de arame farpado. 
Por último - e não menos importante- tenho ouvido de muitos umbandistas - muitos inclusive de renome- que oração de nada adianta. Ao escutar isto, corra amigo e muito. O Divino não deixa nenhuma conversa direta com ele sem resposta. Lucidez não tem preço, assim como nossa liberdade de expressão. Oremos. Saravá!